quinta-feira, 25 de outubro de 2007

A História bem na Foto - 7 > Conteúdo

Neste A História bem na Foto - 7:

Américo Vermelho > A bunda da Abertura
Rogério Reis > Vavá encontra Magalhães Pinto
Alcyr Cavalcanti > Sexo na hora, na rua
João Roberto Ripper > Editando Diretas-Já!
Custodio Coimbra > A multidão das Diretas

Acesse por aqui a série completa:
A História bem na Foto
A História bem na Foto - 2
A História bem na Foto - 8
(ou veja ao final a relação dos participantes).
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Foto do título: Bandeiroso, Aguinaldo Ramos, 2001.

Américo Vermelho > A bunda da Abertura

A foto é uma capa da revista IstoÉ. Não é mais um tema político, é um tema comportamental. E a IstoÉ, nessa época aqui, era uma revista que conseguia captar bem essas mudanças comportamentais. Que também acontecem na década de 80, com a volta dos exilados, a tanga do Gabeira, o Posto 9 em Ipanema, o top-less na praia...
Quer dizer, esses temas e temáticas, que não se tinha, até aquele momento ali. E esta aqui é uma capa da IstoÉ, eu fiz ali em Ipanema, no posto 9. Um cidadão resolveu tirar a roupa e dar um mergulho, ficar pelado na praia, entendeu?, e tomar banho pelado. [Américo ri] E aí eu fiz essa foto aqui.
E eu gosto dela justamente porque, ao contrário daquela anterior da Veja, mais política, que era um tema mais pesado e tal, essa aqui é mais comportamental. É uma coisa mais carioca, tem muito a ver com a cidade, que é lançadora de moda, o que sempre foi, né?... O top-less começou aqui no Posto 9. Eu, pelo menos, tenho várias fotos... E depois, a do Carnaval. Que no Carnaval seguinte as mulheres já botaram os peitos pra fora e tudo. E tá tudo certo, não tinha mais grandes problemas isso... (...)
Você acha que esse é um momento histórico, nesse processo de mudança de comportamento?
Ah, eu acho que é um momento de mudança histórica, muito importante. E voltando àquele tema, que eu estava falando, da importância...
Nesta foto aqui eu tinha um tema, que era o verão. Quer dizer, o verão do Rio de Janeiro. Todo verão se faz matéria aqui sobre o verão. Mais especificamente, foi o verão quando começou... Foi logo depois da Anistia (81, 82, coisa assim...), que foi logo depois da tanga do Gabeira, do top-less na praia... Então foi um momento assim, que mexeu no comportamento do carioca, na praia, aquele momento ali... Então, nesse sentido, quando eu fui para a praia para fotografar, eu realmente fiquei procurando algo que simbolizasse isso. Não podia ser mais algo como o top-less, que essa foto todo mundo já tinha dado, não era mais novidade nenhuma...
Esse foi um lance de sorte completo, ali... Tinha que estar ali, é claro. Mas, chega um cidadão... Chega, tira a roupa, e foi mergulhar. E isso também aconteceu rapidamente, isso aqui. Aquelas coisas de jornal... Você tá ali, viu, bota a lente, faz! E depois vê... E eu, na hora, não vi que ficou exatamente ali, só, só... [aponta a foto], que não tava o corpo inteiro...




Se bem que eu tenho a seqüência inteira... Ele correndo, entrando na água e mergulhando. Aí, em termos editoriais, para não ficar muito chocante... [Américo ri], aí, botaram essa aqui...
Você participou desse processo de escolha da foto?
Não, não... Nessa época, ao contrário de hoje, que é tudo digital, era cromo. Então você fazia tudo isso e a gente nem revelava aqui no Rio. Mandava para São Paulo, era revelado lá o filme, e daí pra frente você perdia o controle total. Você não vê mais nada. Pode no máximo dar uma ligada, falar, sugerir, “olha, tem uma foto...”. Mas nem eu sabia o que tinha, exatamente o que tinha. Essa foto exatamente, nem eu... Porque, você faz a seqüência, tem que revelar o filme para ver exatamente o que saiu...
Não participei. Mas eu confiava muito no pessoal da IstoÉ nessa época, eles tinham um olho bom para isso. O Hélio Campos Mello, o João Bittar, que trabalhavam lá, a Cristina Villares, o Zé Bittar, o Juca Martins... Então, era uma turma boa que fotografava lá. E era um processo meio coletivo, a IstoÉ tinha isso. Ali todo mundo chegava e dava um palpite, falava e tal... Quer dizer, não era uma escolha solitária do Hélio. Ele podia fazer também, mas não era.
E o pessoal tinha um olho bom, o pessoal tinha uma visão legal da fotografia. Uma fotografia menos comportada, menos cheia de regra. Que a Veja era muito cheia de regras, tinha coisa que pedia-se para não fazer, pedia-se para não fazer daquele jeito. E a IstoÉ fez justamente uma outra vertente... Ela era menos comportada, menos cheia de regras. Ela explorava o que o fotógrafo tinha de melhor. Você tinha o seu estilo, ela explorava o melhor do seu estilo, e não... Fazia o contrário do que a Veja fazia. A Veja, quando aparecia um talento novo, ela contratava, mas, ao contratar, exigia que o cara deixasse de lado o seu talento para fazer segundo as regras visuais da empresa. Quer dizer, aquele talento perdia-se, sei lá... A IstoÉ, nessa época, não. Ela fazia justamente o contrário, o que a diferenciava.
Havia diferença de culturas visuais?
Tinha, sim, claro... Por exemplo, tem uma clássica, assim que esse tema vem à tona... A turma da IstoÉ gostava muito da grande-angular. E a turma da Veja gostava muito da tele, do plano fechado. Quer dizer, dos planos mais fechados e tal... A turma da IstoÉ gostava da grande-angular porque você enquadra mais coisas para aquele seu tema, que você está fotografando. Você contextualiza, você sabe onde ele está, você não tira ele do ambiente. O que a tele não dá... Com a tele você fecha no objeto fotografado, você descontextualiza. E a turma da IstoÉ era o contrário, a gente gostava de contextualizar. Mas não era só isso, não era uma regra fixa, imagina... Mas era uma coisa que caracterizava, de uma revista para a outra.


Américo Vermelho > formado em Comunicação Social pela Universidade Católica do Paraná (1978), começou a fotografar no Paraná em 1969.
Trabalhou como fotógrafo para os principais jornais e revistas do Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro, tais como: O Estado do Paraná, O Estado de S. Paulo, O Globo, Jornal do Brasil, Folha de S. Paulo, assim como nas revistas IstoÉ, Veja e Senhor. Como cinegrafista, trabalhou para as TV Tibagi e TV Paraná, no Paraná.
Entre 1983 e 1986, foi professor de Fotojornalismo na PUC do Rio de Janeiro.
Atualmente, além de atuar como fotógrafo para diversos jornais e revistas (e cursos de fotografia), desenvolve trabalhos na área da fotografia digital.

Rogério Reis > Vavá encontra Magalhães Pinto

Transcrição do depoimento de Rogério Reis, gravado em 07 de maio de 2007.

Escolhi também a foto do encontro do Magalhães Pinto, antigo presidente do Banco Nacional e deputado, que foi fazer uma homenagem ao busto de João Pessoa, na praia de Botafogo. Quando o engraxate, que trabalhava ali, colado ao busto, percebeu a presença do Magalhães Pinto, correu na direção dele, o abraçou, passou a mão na cabeça dele...
Enfim, uma invasão, um abuso de intimidade... Que é uma foto interessante. Ela é surpreendente, porque ela quebra umas regras de convivência.



Qual é o valor que você dá a ela hoje em dia? Naquele momento teve algum significado especial?
Significado na história do país, naquele momento?... Eu acho que não. Ela foi vista só como uma foto desconcertante, que causa um estranhamento e que poderia ser traduzido como humor. Mas, ela não foi conseqüente a ponto de denunciar alguma coisa ou mudar o percurso histórico de alguém.
Ela representava aquele momento?
Ela foi feita dentro de uma atmosfera... Que a gente estava ainda dentro da ditadura, e havia, mais do que nunca, um distanciamento das autoridades com relação ao povo. Isso, com certeza!
E o Vavá, ele rompe com isso, parte na direção do Magalhães Pinto. Lembrando que o Vavá, o engraxate, estava alcoolizado. Então, isso também ajudou essa performance do Vavá. E ele parte para o Magalhães Pinto, chamando o Magalhães Pinto de Magá, como se fosse o amigo do botequim da esquina. Enfim, não reconhece no Magalhães Pinto a figura de um candidato, um político. Ele parte para o Magalhães Pinto numa ação, numa atitude, abusada. E isso quebra as regras. É interessante, gera um desequilíbrio, enfim, uma surpresa.
Eu acho que ela ficou no repertório das fotos bem-humoradas. É interessante por isso.

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Rogério Reis > nasceu em abril de 1954 no Rio de Janeiro e descobriu a fotografia nas oficinas de arte do MAM-Museu de Arte Moderna, nos anos 70. Trabalhou no Jornal do Brasil (1977), no O Globo (1980), na revista Veja (1983), e participou do Grupo F4 de fotógrafos independentes dos anos 80. Durante 3 anos seguidos (85 a 87), fotografou Ayrton Senna para o Banco Nacional, a convite da agência de publicidade MPM. Foi durante 5 anos editor de fotografia do Jornal do Brasil (91 a 96). Em 1999 recebeu o Prêmio Nacional de Fotografia da Funarte. Inspirou e emprestou seu nome ao personagem do fotógrafo no filme Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, baseado no livro do escritor Paulo Lins. Em 2007 passa a integrar o grupo de fotógrafos do projeto da UNESCO, Our Place - the Photographic Celebration of the World's Heritage.É um dos fundadores da Tyba (1991), onde trabalha como editor de projetos especiais; autor do livro Na Lona, Editora Aeroplano (2001) e co-autor dos livros Revisitando a Amazônia de Carlos Chagas - Editora Fiocruz (1996) e Retratos de Outono - Editora Sextante (1999).

Alcyr Cavalcanti > Sexo na hora, na rua

Mendigos da rua Santana: A Imagem Proibida.

Era manhã, em torno de nove horas, no ano de 1977. Fui designado para cobrir o treino de Vasco sem repórter, e “caprichar” na foto do Roberto Dinamite, o maior ídolo do Vasco, na época. Segundos depois da saída do jornal, o carro indo pela rua Santana em direção à presidente Vargas, vejo um grupo de moradores de rua, em diversas situações que me chamaram a atenção. Afinal, uma das principais características do repórter-fotográfico estar sempre atento, “de olho no lance”. Saltei do carro e fiz um filme do grupo, bebendo, brigando, discutindo, dialogando. Era um grupo heterogêneo, parecendo excitados, sob efeito de estimulantes. Fiz as fotos em uns cinco minutos mais ou menos e fui cumprir a pauta que me foi designada, o treino do Vasco.


Na volta, em torno de 11,30h, resolvi dar uma olhada para ver se ainda estavam lá. Estavam, e ainda mais “animados”, talvez sob o efeito do álcool e éter que estavam consumindo... Um deles começa a acariciar uma das moradoras de rua, as cenas de agressividade se transformam em cenas de carinho. Depois de algumas carícias, passam a praticar sexo oral. Estava a uma distância de mais ou menos 25 metros, pois temia alguma reação. Afinal de contas, era uma invasão de privacidade, pois aquela parte da rua era a “casa” deles.



Fui para o jornal, revelei os filmes do treino e dos mendigos. A seqüência fotográfica passou por toda redação e pela diretoria, sendo motivo de risos de maneira geral., embora deveriam chorar. Mas não foi publicada, pois seria um “atentado à moral e aos costumes”, conforme a opinião dos editores que haviam submetido as imagens ao crivo do dono do jornal.
O argumento de atentado à moral e incitamento à subversão, previstos na Lei de Segurança Nacional me renderam processo e um exaustivo interrogatório na Policia Federal. Afinal, estávamos ainda nos “anos de chumbo”.
A sequência foi publicada na íntegra no jornal alternativo O Repórter, com um belíssimo e pequeno texto em forma de poema do inesquecível Tim Lopes e, junto com outras imagens (zona de meretrício e outras), me renderam o processo citado acima
Na Polícia Federal o delegado tentou mostrar que eu havia induzido os mendigos a praticar as situações mostradas nas fotos, e que eu deveria, como um bom cidadão (segundo o delegado), ter impedido aquelas cenas em frente (no pátio) da Igreja de Santana, em baixo do busto do cardeal Dom Sebastião Leme. As fotos seriam uma provocação e um atentado à moral vigente. Argumentei e pedi perícia para provar que estava a mais de 25 metros de distância, não tendo influência na situação social (eu usava uma objetiva de 135mm), e que estávamos próximos a uma delegacia de policia, a 6ª DP. Os agentes da lei teriam ou não possibilidade de influir na cena. O bom senso prevaleceu e o processo foi arquivado.




Câmera Nikon F objetiva Nikkor 135mm, filme Kodak T-X (400 ISO). Imagens sem manipulação.

João Roberto Ripper > Editando Diretas-já!

Transcrição de trecho (4’25”) de depoimento de João Roberto Ripper ao autor, em vídeo, em 25/05/2005. Gravação depositada no LABHOI - Laboratório de História Oral e Imagem da UFF - Universidade Federal Fluminense, em Março de 2008..


Meu nome é João Roberto Ripper e eu sou fotógrafo-documentarista. E nessa época eu estava trabalhando como repórter-fotográfico. Trabalhei na Última Hora e trabalhei no O Globo. Especificamente na época das Diretas-Já eu trabalhava no jornal O Globo e havia uma insatisfação popular contra as matérias, que saíam na TV Globo e no jornal O Globo, que diziam respeito às questões da ditadura e às questões do movimento sobre as Diretas, sobre as eleições, no Brasil. Isso começou a dar alguma insatisfação entre os profissionais porque havia alguns casos de bloqueio do exercício profissional, uma indignação...
Quer dizer, as pessoas não estavam satisfeitas com a resposta, no dia seguinte (ou no mesmo dia, no caso da TV), do que ia ao ar ou saía nos jornais. Então, começaram a dificultar. Houve caso de impedir o trabalho, houve casos até de se virar o carro da TV Globo, ameaça de virar carro do jornal O Globo. E aí eu me lembro que conversamos, nós conversamos, alguns fotógrafos... Eu me lembro de um papo, até um papo com Aníbal Philot, que hoje é falecido, mas que era talvez o fotógrafo de mais expressão, à época, lá no Globo, e a gente comentando como é que a gente ia sair dessa, né?... Como é que a gente ia passar a determinar, de alguma maneira, o que fosse publicado...
E a discussão que a gente teve é que a gente precisava editar na hora de fotografar, isso muito antes. Então, assim, como fazer isso sem impedir a criatividade do fotógrafo?... Eu me lembro bem que a gente comentou, conversou, que este fotógrafo ia ter o cuidado de só trazer para o jornal material muito editado, que mostrasse o grosso, a multidão, e que detalhes dessas fotos ele fizesse com as suas próprias câmaras.
Isso, por quê?... Porque, se está em uma grande manifestação e se além de fotografar a manifestação, que é de uma expressão popular muito grande, você mostrasse detalhes (e esses detalhes são, por exemplo, a lateral do palco, ou algo assim), acabavam saindo fotos que mostrassem pessoas brincando, ou curiosidades, ou complementos dessa matéria, mas que não mostrassem grande número de pessoas.
Então eu lembro que na grande passeata da Rio Branco, o Philot foi fotografar, me lembro da gente comentando uma tática. Ele falou: “eu só vou fotografar de tele-objetiva”. E ele fez toda a passeata com tele, e só fotos mostrando aquela multidão comprimida, uma monstruosidade de pessoas. E eu me lembro que quando ele chegou com o material, pediram mais fotos. E foram mais fotos para a redação. Não satisfeitos, pediram os contatos e viram que tinha uma multidão enorme. E aí eu lembro que trocaram a manchete. Eles iam dar a mesma manchete... Ele iam dar menos gente do que na época tinha dado a Polícia Militar. E eles trocam a manchete, botam mais gente, que todas as fotos que eles tinham eram de multidão.
Então essa foi uma das coisas positivas, me lembro bem, a gente comentando, vibrando...

E é claro que eles deram o troco. Quando foi o grande comício das Diretas-Já, aí na Presidente Vargas, eu me lembro que eles estipularam alguns repórteres especiais para ficar junto dos fotógrafos especiais, em vários pontos da Pres. Vargas, e dando... mandando fotos desde o início, né?... Com todas as etapas, é óbvio que você tem gente chegando, você tem o movimento ainda fora do seu apogeu... E aí O Globo dá um número muito menor do que o número de pessoas que tem na manifestação do comício pelas Diretas. Eles deram, se não me falha a memória, menos gente do que deu a Polícia Militar.



Então é um pouco do que era esse processo de luta, entre você tentar informar o mais próximo o que você sentia, e lutar contra um caminho que tentava minimizar, diminuir a informação.

João Roberto Ripper > ingressou na carreira de repórter-fotográfico em 1972, aos 19 anos de idade, na Luta Democrática, o jornal de Tenório Cavalcanti. Passou em seguida pelo Diário de Notícias, a Última Hora, a sucursal carioca do Estadão e por O Globo, sem contar os muitos trabalhos como freelancer para vários outros jornais e revistas.Disposto a levar as pessoas a refletirem sobre a realidade brasileira, deixou O Globo e foi participar da criação da Agência F4, uma das agências que ajudou a “romper com a hipocrisia de que o jornalista é imparcial”.Deixando a F4, criou o Projeto Imagens da Terra, a fim de “seu grande sonho: a fotografia a serviço dos direitos humanos”. Registrou índios, seca no Nordeste, dramas sociais urbanos, exploração de carvoeiros e crianças, denúncias de trabalho escravo, entre outros temas.Após oito anos, deu partida, na mesma linha, a Imagens Humanas, projeto individual. Participa também do projeto coletivo Imagens do Povo, agência e banco de imagens do Observatório de Favelas, dando aulas na Escola de Fotógrafos Populares, no Complexo da Maré, Rio de Janeiro, para moradores de comunidades carentes, que fazem um trabalho documental sobre o local onde vivem.
Fonte: ABI Online, Em foco (http://www.abi.org.br/paginaindividual.asp?id=516)


Custódio Coimbra > A multidão das Diretas

A foto que te mando foi feita num momento muito importante e especial para mim e para o país. Época da reabertura política, 10 de abril de 1984. Passados os anos de ditadura feroz, com muitos mortos e desaparecidos, os anistiados de volta, a luta do movimento pelas eleições diretas no Brasil ganhava as ruas. Eu tinha 30 anos e sentia na pele. Estava há menos de um ano na Ultima Hora e, nos fins de semana em que estava de folga, fazia frila no Jornal do Brasil.
10 de abril, quarta feira. Dia de comício pelas diretas no Rio, eram esperadas mais de um milhão de pessoas. O chefe da fotografia, Jorge Nicolella, mandou a turma de choque para o palanque montado na Presidente Vargas com a Rio Branco. Chiquito Chaves, Lúcio Bernardo, Avanir Niko, Julio César Pereira, entre outros “cobras”. E me deixou livre para fazer a foto geral. Essa era a minha pauta.
Saí muito antes e procurei o prédio mais alto, na esquina com a Avenida Passos, deixei meu nome na portaria e fui almoçar nas proximidades. Quando subi, para minha surpresa, já havia no terraço vários fotógrafos, debruçados na mureta. Era um local esquisito, que só tinha um cantinho com a vista geral limpa. E aí começou o revezamento. Era cedo, ainda, e lá fiquei a tarde toda. De cima, vi a multidão chegando aos poucos, grupos cantando, outros correndo. E nós no revezamento. Aos poucos o local foi esvaziando. Se não me engano, ficamos eu e o Paulo Jares, da Veja.
A noite começou a cair. Do palanque, as vozes do Ulysses, do Lula, do Tancredo, do Chico Buarque, do Teotônio Vilella enchiam o ar. Da multidão vinha o coro surdo, “um, dois, três... quatro, cinco, mil... queremos eleger o presidente do Brasil”. Eu, baixinho, cantava junto. Chegou à hora do lusco-fusco, aquele momento mágico em que a luz natural cai, dando lugar à iluminação das ruas, dos prédios e do palanque. “Coração de estudante” soava do alto-falante e das bocas das pessoas. Tive a certeza de que tinha feito a foto naquele momento.





No dia seguinte, página inteira. No fim de semana seguinte, fui para o JB frilar e, para minha surpresa, a capa da UH estava pregada no “aquário” do editor Alberto Ferreira. Naquele ano não votamos para presidente, mas entrei no JB. Quando enfim pude votar, em 89, eu já estava entrando no Globo, depois de cinco anos trabalhando com uma das maiores equipes de fotógrafos do Brasil.


Custodio Coimbra > fotografa desde o início dos anos 70. Nascido no Rio de Janeiro, casado, pai de quatro filhos, passou pelos principais jornais do Rio (Repórter, em 1978, Última Hora, em 1982 e Jornal do Brasil, 1984). Trabalha desde 1989 no jornal O Globo.
Participou de várias exposições individuais e coletivas, todas na linha sócio-ambiental. Em 2005, “Diário do Rio”, exposição no Centro Cultural Correios, rebatizada de “Le Brésil à la une”, foi também exposta na Maison des Amériques Latines em Paris, como parte do calendário do Ano do Brasil na França. Foi coordenador e editor de Fotografia dos Jornais de Bairros do Globo, de circulação semanal. É responsável por matérias especiais produzidas para as edições dominicais. Publicou trabalhos em vários livros, tais como “O Rio sob as lentes de seus fotógrafos”, de 1992; “Tons sobre Tom — A vida e a obra de Tom Jobim”, de 1996 e “Brasil 500 anos”, em 2000.

(Fonte adicional: "A mágica da fotografia", em ABI Online/Em foco - http://www.abi.org.br/paginaindividual.asp?id=491

A série A História bem na Foto

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"Depoimentos exemplares":
Antonio Andrade e Campanella Neto
Depoimento do autor:
Aguinaldo Ramos > Brizola pula a fogueira

Vera Sayão > Brizola e o Beijoqueiro
Luiz Carlos David > O Papa no Aterro
Renan Cepeda > Polícia no Morro
Juvenal Pereira > JK nos Braços do Povo
Alcyr Cavalcanti > Desafetos Cordiais
A História bem na Foto - 3 >



Mabel Arthou > Mais um Domingo...
Antonio Batalha > Tancredo se despede
Silvana Louzada > Collor x general Tinoco
Américo Vermelho > O enterro de D. Lyda
Elisa Ramos > Deficientes físicos: superação

A História bem na Foto - 4 >

Zeca Guimarães > A dor de Tancredo
Antonio Scorza > Troféu de Guerra
Luciana Whitaker > Bala Perdida
Rogério Reis > O Poeta vira Estátua
Masao Goto Filho > Vitória nos Pênaltis

A História bem na Foto - 5 >

Sergio Araujo > Pulo para a morte
Gilson Barreto > O prédio cai
Walter Firmo > Um santo enternecido
Cristina Zappa > Na alma
Luiz Morier > Todos negros

A História bem na Foto - 6 >

Pedro Agilson > A chacina de Vigário Geral
Delfim Vieira > Seca no Ceará
Evandro Teixeira > Vinicius, Tom e Chico
Claudio Versiani > Taffarel e Baggio
Alex Ferro > Carnaval de Rua

Ronaldo Theobald > O Deus de calção e chuteira
Georges Racz > O nascimento de uma paixão
Héctor Etchebaster > Homenagem no mar
Januário Garcia > Marcas do tempo
Luiz Carlos David > Asa-delta sobre o Cristo